Sesc Jazz: uma nova era?


SHOWs
Sesc Jazz, festival com mais de uma década de história, retorna após uma pausa com mais de 20 atrações internacionais e nacionais... 



Por Fabricio Vieira


Após uma pausa em 2024 para “uma reestruturação de formato”, o Sesc Jazz anunciou seu retorno para outubro deste ano, gerando muita euforia. Afinal, ano após ano, desde quando surgiu como Jazz na Fábrica em 2011, o evento de jazz promovido pelo Sesc-SP se sedimentou como o mais importante festival do gênero no país – podemos dizer até: da América Latina. Por seus palcos passaram nomes lendários e revolucionários, muitos deles trazendo seu trabalho pela primeira vez ao Brasil: William Parker, Anthony Braxton, Matthew Shipp, Maggie Nicols, Nate Wooley, McCoy Tyner, Muhal Richard Abrams, Roscoe Mitchell/AEC, Sun Ra Arkestra, John Zorn, Anette Peacock com Roger Turner, Gary Peacock, Ivo Perelman, Sun Rooms, Alexander von Schlippenbach e a Globe Unity Orchestra, Fred Frith, Vijay Iyer, Grupo Um, Archie Shepp, Fire!, Soft Machine, Wadada Leo Smith com Henry Grimes, David Murray, Abdullah Ibrahim, Henry Threadgill... Não é difícil, com uma escalação dessa em mente, aguardar com ansiedade a divulgação do line-up a cada nova edição do evento. Mas o que aconteceu em 2023 se repete agora: a proposta do festival parece ter mudado, passando a olhar mais para certo world fusion, pescando artistas que mais margeiam (muitas vezes nem isso) o jazz do que emergem/mergulham dele/nele: a curadoria, o enfoque, o rumo do evento mudou. É um Sesc Jazz com nova cara, com outra roupagem. E não se trata de ser algo melhor ou pior. São escolhas de caminhos e, sem dúvida, há bastante público interessado nesta nova face do evento – uma sugestão: o festival poderia até adotar um novo nome, algo como Sesc Folk Jazz... 
Para quem vive com olhos e ouvidos voltados ao universo jazzístico mais inventivo e intenso, parece que os tempos mágicos do Sesc Jazz ficaram para trás – imaginem se o line-up tivesse alguns desses nomes, só citando figuras fundamentais da cena contemporânea inéditas no festival: Tomeka Reid, Patricia Brennan, Tyshawn Sorey, Camila Nebia, Mary Halvorson, Kris Davis, Pat Thomas, Satoko Fujii, Matana Roberts, Isaiah Collier, James Brandon Lewis, Aruán Ortiz, Darius Jones, ou seja, muito fácil elencar nomes incríveis para um festival atento ao que de mais criativo acontece na cena jazzística de hoje, mundo afora. Edições como as de 2018 (com Henry Threadgill, Fred Frith com Susana Santos Silva, Vijay Iyer, Archie Shepp, James Blood Ulmer, Charles Tolliver) e de 2019 (com Art Ensemble of Chicago, Sun Ra Arkestra, John Zorn, Maggie Nicols, Gary Bartz, Terri Lyne Carrington, Gard Nilssen) já soam como um saudoso passado distante. De qualquer forma, mesmo com o jazz sendo coadjuvante em um festival de... jazz (!), algumas apresentações merecem atenção especial (Kahil El’Zabar e Amina Claudine Myers são imperdíveis). O evento acontece de 14 de outubro a 2 de novembro, em diferentes unidades na capital e no interior de São Paulo. Marque na agenda e fique atento, já que os ingressos costumam esgotar com rapidez...

 


*DESTAQUES DO SESC JAZZ*

 

TIGRAN HAMASYAN

O pianista armênio Tigran Hamasyan, na estrada há duas décadas, tem criado uma obra sonoramente variada, com títulos registrados por selos referenciais como ECM e Nonesuch. Fazendo um jazz contemporâneo com elementos folk de sua terra, ora vai mais para um lado, ora para outro. Sua discografia traz títulos como “StandArt” (2022), no qual revisita standards jazzísticos em uma roupagem contemporânea, acompanhado de nomes como Joshua Redman e Ambrose Akinmusire. Mas no palco do Sesc Jazz parece que o foco estará em seu mais recente trabalho, “The Bird Of A Thousand Voices”, que traz um jazz com algo ambient, eletrônico, em um fusion que não ignora certa pitada rock progressivo. O quarteto de Tigran Hamasyan conta com Yessai Achot Karapetian (teclado, sintetizador), Marc Karapetian (baixo) e Arman Sahak Mnatsakanyan (bateria).

 

Quando: 16, 18 e 19 de outubro

Onde: Sesc São José dos Campos (16) e Sesc 14 Bis

Quanto: de R$ 18 (credencial) a R$ 60 (inteira)

 

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DOM SALVADOR convida AMARO FREITAS

O cultuado pianista Dom Salvador, pioneiro do samba jazz e figura fundamental da música negra no Brasil dos anos 60 e 70, volta ao palco do Sesc Jazz (onde ele esteve em 2018) para celebrar mais de meio século de música com um convidado muito especial, o pianista pernambucano Amaro Freitas. Como Dom Salvador, de 87 anos, se mudou para os Estados Unidos em meados da década de 1970, vê-lo no palco é sempre um evento a não se perder. A banda que trará para as apresentações conta com Laura Dreyer (sax e flauta), Gili Lopes (contrabaixo), Graciliano Zambonin (bateria), Zé Carlos (guitarra) e Armando Marçal (percussão).

 

Quando: 15, 16 e 17 de outubro

Onde: Sesc Pompeia (Teatro)

Quanto: de R$ 18 (credencial) a R$ 60 (inteira)

 

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KAHIL EL’ZABAR

O percussionista de Chicago Kahil El’Zabar está na ativa desde os anos 70, época em que entrou para a AACM (Association for the Advancement of Creative Musicians), que viria inclusive a presidir. Seu principal projeto é o Ethnic Heritage Ensemble, herdeiro e difusor da Great Black Music idealizada pela AACM. “I knew in my heart, that this band would endure. My concept was based in logic as it pertains to the history of Great Black Music. In other words, the Ethnic Heritage Ensemble has a strong rhythmic foundation, innovative harmonics and counterpoint, well-balanced interplay and polyphony among the players for highly developed ensemble dynamics”, diz o percussionista. O trio, criado há cinco décadas, se foca no diálogo entre sopros e percussão, tendo editado mais de 15 álbuns – o mais recente é “Open Me, A Higher Consciousness Of Sound And Spirit”, de 2024. Kahil El’Zabar esteve no Brasil (no próprio Sesc Jazz) em 2018, acompanhando Archie Shepp. Agora ele retorna com o Ethnic Heritage Ensemble, ao lado do trompetista Corey Wilkes e do saxofonista Kevin Nabors – a eles se junta o violoncelista Ishmael Ali. Além dos dois concertos programados, El’Zabar comandará uma Masterclass, onde falará sobre a cena de Chicago, sua história e influências.

 

Quando: 25 e 26 de outubro

Onde: Sesc Pompeia (Teatro)

Quanto: de R$ 18 (credencial) a R$ 60 (inteira)

 

MASTERCLASS

Quando: 28 de outubro

Onde: Sesc Consolação

 

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AMINA CLAUDINE MYERS

Outra voz ligada à cena criativa de Chicago, a pianista e organista Amina Claudine Myers é uma lendária pioneira artista do mundo do free jazz, sendo a primeira mulher a fazer parte da AACM. Myers trocou Chicago por Nova York em 1976, se integrando à efervescente cena loft. Seu álbum de estreia seria “Poems For Piano”, um registro solista no qual ela revisitava peças do saxofonista Marion Brown, captado em 1979. No ano seguinte, lançou um de seus clássicos, “Song For Mother E”, um duo com o percussionista Pheeroan AkLaff. Suas raízes no blues e no gospel se revelam em diferentes discos no qual explora também sua profunda voz. Seus mais recentes registros são um belíssimo disco em duo com Wadada Leo Smith (“Central Park’s Mosaics of Reservoir, Lake, Paths and Gardens”) e o solista “Solace of the Mind”. Para os dois concertos no Sesc Jazz, que encerram o festival em grande estilo, Amina Claudine Myers virá acompanhada de seu trio, com o baixista/guitarrista Jerome Harris e o baterista Reggie Nicholson.

Quando: 1 e 2 de novembro

Onde: Sesc Pompeia (Teatro)

Quanto: de R$ 18 (credencial) a R$ 60 (inteira)